HORMÔNIOS E RECEPTORES – PARTE 1

Fala rapaziada!

Os primeiros seres vivos do planeta eram compostos por uma única célula. Ao longo de milhões de anos, entidades cada vez mais complexas foram surgindo, como plantas, dinossauros e nós, humanos.

Imagine você o crescente grau de dificuldade que estes novos viventes foram enfrentando para que suas células conseguissem se comunicar entre si. Uma coisa é ter uma única célula, onde tudo acontece dentro de um espaço fechado e mais facilmente controlável; outra, no entanto, é o indivíduo ter bilhões de células!

Duas importantes formas de comunicação surgiram ao longo da história: o sistema nervoso, que não nos interessa neste artigo, e o sistema endócrino, ou seja, os hormônios, que serão o palco da discussão desta série.


I) O QUE SÃO HORMÔNIOS?
Aposto que você já pensou nisso aqui, heim, malandrão?!
Dependendo do quão velho for o manual de fisiologia endócrina que você for consultar, encontrará que “hormônio é uma substância química produzida por tecidos especializados e secretada na corrente sangüínea, na qual é conduzida até os tecidos alvo”.

(Até deixei sangüínea com trema para dar um tom de desatualização, apesar de gostar muito deste sinal gráfico.)

Esta definição não serve por inúmeros fatores, como, por exemplo, a exclusão dos ectormônios (ex: feromônios), que são liberados no ambiente, e de hormônios secretados no interstício celular, e não no sangue.

Por conta disso, uma melhor definição seria a do livro da Margarida Mello Aires: “substância química não-nutriente capaz de conduzir determinada informação entre uma ou mais células”. Contudo, tenha em mente que ela também não é perfeita...

Acho este conceito bastante interessante, pois nos remete à ideia de “informação”, que, para mim, é a chave do que seja um hormônio.

Esta informação visa basicamente a três tipos de ações diferentes:

- garantir a reprodução. Exemplo: FSH e LH.
- promover crescimento e desenvolvimento. Ex: GH e T3.
- garantir a homeostasia. Ex: paratormônio e calcitonina.

Os hormônios são produzidos por células endócrinas, especializadas na sua síntese e secreção. Quando todas as células de um órgão são endócrinas, como é o caso da tiroide, podemos utilizar o nome glândula.

Porém, em alguns casos, como o do pâncreas, não temos apenas células endócrinas, mas também de outros tipos (neste caso, as que produzem enzimas, por exemplo). Sendo assim, não se utiliza o termo glândula.

Quem recebe a informação produzida pela célula secretora é a célula alvo. O grande diferencial desta é que ela possui um receptor altamente específico para um determinado hormônio, de modo que este não possa expressar uma ação em qualquer parte do corpo, restringindo-se apenas aos seus alvos especiais.

Aquela ideia de chave-fechadura é bastante interessante aqui: pense no hormônio como uma chave e o receptor, fechadura. A chave que liga seu carro não é a mesma que abre a porta da minha academia, que por sua vez não é a mesma que destrava o cadeado da bicicleta da Mariazinha.

Portanto, cada chave irá penetrar apenas no seu buraquinho específico (ui!), já que não é capaz de adentrar e girar em outros.


II) TIPOS DE HORMÔNIOS: uma classificação quanto a sua natureza.

Caso os classifiquemos de acordo com sua natureza, existem dois tipos de hormônios: hidro e lipossolúveis. Eles diferem bastante entre si, o que envolve a suas composições, formas de transporte, modos de ação e tipos de respostas que provocam.


- HORMÔNIOS HIDROSSOLÚVEIS.

Tal antagonismo deve-se à polaridade destas moléculas: nosso sangue pode ser visto como água, substância polar, que possibilita a solubilização de substâncias também polares, como hormônios hidrossolúveis (daí o nome).

Por conta disso, quando secretados no sangue, eles não precisam de moléculas de transporte para circular, mas é possível que alguns tipos se liguem a elas por questões estratégicas, como é o caso do GH e dos IGF, por exemplo, que costumam circular ligados a uma proteína carregadora.

Exemplo disso é a manutenção de uma reserva corpórea, de modo que nem todo hormônio hidrossolúvel lançado no sangue possa causar algum efeito ou já ser degradado.



Por estarem ligados a uma molécula transportadora, eles não conseguirão se ligar a um receptor na membrana celular ou sofrer a ação de uma enzima, logo, momentaneamente, não levarão a informação.

Isso também é importante para evitar um efeito muito elevado no corpo, a ponto de prejudicar a homeostase.

Bom, mas como tudo na vida, essa vantagem de se solubilizar no sangue tem um preço: impede a dissolução em substâncias apolares, sendo, a principal, a membrana celular.

Sendo assim, o hormônio hidrossolúvel não é capaz de entrar na célula. “Caraio, como ele vai produzir efeitos, então?”, talvez você esteja se perguntando. Ou, no caso daquele usuário de drogas que nunca estudou porra nenhuma, “esse ensinando musculação não manja porra nenhuma. Meu GH dá efeito sim, vacilão!”.

O que acontece é que esse tipo hormonal atua ligando-se a um receptor localizado na membrana da célula (olha eles aqui, os famosos receptores!), já que não pode ultrapassá-la, agindo através do que se conhece por “segundo mensageiro”.

Depois dessa ligação, uma cascata de reações acontece no interior da célula, envolvendo diversas substâncias, como o AMPc (em alguns casos), que alguns já devem ter ouvido falar, e, por fim, farão “alguma coisa” no núcleo, promovendo a transcrição e tradução de algum(ns) gene(s), ou seja, induzirão os efeitos que o hormônio trouxe como informação.

É importante mencionar que esse sistema de receptor de membrana e de segundo mensageiro tem uma importantíssima exceção: os hormônios da tiroide, T3 e T4.

Eles são hidrossolúveis, haja vista que são constituídos por tirosinas, que são aminoácidos. No entanto, durante sua síntese, as tirosinas são acopladas e iodadas, perdendo suas características hidrossolúveis e ganhando as lipossolúveis.
Observe a figura: a célula secretora (secreting cell) secreta o hormônio num vaso (blood vessel) e este é transportado pelo sangue até um célula alvo (target cell), que contém um receptor específico. 
Por conta disso, eles são capazes de atravessar a membrana celular, contando com a ajuda de um fator facilitador. Dentro da célula, eles agirão diretamente no núcleo.

A título de curiosidade, por esta mesma peculiar característica, menos de 1% deles está livre no plasma sanguíneo: mais de 99% do T3 e do T4 está ligado a um transportador, como as albuminas do sangue, de modo que tenhamos uma boa reserva na circulação, além, é claro, de evitar que uma grande quantidade de T3 saia produzindo seus efeitos metabólicos, a ponto de desregular todo o funcionamento do organismo.

Continuando, o grupo dos hidrossolúveis também é conhecido apenas pelo nome de hormônios proteicos. Como você deve se lembrar, proteínas são formadas por longuíssimas cadeias de resíduos de aminoácidos, conectados entre si por ligações peptídicas.

Sendo assim, a composição desta categoria hormonal poderá ser desde um simples aminoácido, passando por peptídeos simples, até grandes proteínas. É por isso que algumas pessoas usam o termo "hormônios peptídicos", porém, gosto de hidrossolúveis pois é muito mais abrangente.

Fazem parte deste grupo: o GH ou hormônio do crescimento, a insulina e o glucagon pancreáticos, o T3 e o T4 da tiroide, adrenalina, noradrenalina, dopamina, melatonina, etc. Cito estes pois acredito que sejam os mais famosos, especialmente dentro do nosso círculo social marombístico.


Ficamos por aqui. No próximo capítulo continuarei a discussão, trazendo os lipossolúveis, com destaque para a testosterona, e já encerrarei esta curta série de apenas duas partes. Até lá!

OBSERVAÇÃO: acesse a parte 2 desta série clicando AQUI.

REFERÊNCIAS:
- Guyton, Arthur C. Tratado de fisiologia médica. 9ª edição. Guanabara Koogan.
- Aires, Margarida de Mello. Fisiologia. 3ª edição. Guanabara Koogan.



FERNANDO PAIOTTI
Personal Trainer e Consultor Online
CREF 151531-G/SP


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