HIDRATAÇÃO/DESIDRATAÇÃO, HIPONATREMIA E MUSCULAÇÃO – PARTE 1

Fala rapaziada!

Todo mundo está cansado de ler e ouvir aquelas máximas sobre a importância de uma boa hidratação ou que devemos tomar X copos de água por dia, que faz bem para a saúde e blá-blá-bá: são as mesmas historinhas de sempre...

Sendo assim, decidi abordar o tema de uma outra maneira, saindo do senso comum e do simples fornecimento de informações vagas. Além disso, trouxe um assunto raramente discutido, chamado hiponatremia, que se relaciona a distúrbios causados pelo consumo excessivo de água.
Boa leitura!

1. FORMAS DE TROCA DE CALOR

Antes de discutirmos a questão da água, vamos explorar um pouco a ideia de perda de calor, que é um processo intimamente ligado à hidratação/desidratação.

O primeiro caso é a convecção, que diz respeito à propagação de calor através do movimento de fluidos (líquidos e gases), envolvendo transporte de matéria. Para explorá-la, trago uma pergunta: qual a diferença entre um estado de ar parado e com vento?

A quantidade de partículas que se chocam com nosso corpo é muito maior com vento, haja vista que, quando ocorre o contato, elas roubam energia da nossa pele, realizando a troca de calor. Esse efeito é potencializado, por exemplo, quando utilizamos um leque ou ventilador, uma vez que aumentamos a quantidade de partículas em contato conosco e, consequentemente, perdemos calor mais rapidamente.

Outro processo importante que podemos mencionar é a condução, onde a troca de calor é feita de átomo a átomo sucessivamente, quando eles entram em contato. Temos também a irradiação, ou radiação, que pode ser sentida quando nos aproximamos de uma fonte de calor e esta esquenta nossa pele. Ela tem a ver com transferência via ondas eletromagnéticas e não depende de contato.

Por fim, temos a evaporação/congelamento, que seria uma forma de trocar calor através de uma mudança de estado físico.

Confesso que a discussão ficou um tanto quanto árida e parecendo uma aula de física do segundo colegial, porém, ela foi de extrema importância para que você entenda de fato como se dá um dos principais processos de desidratação e perda de calor do nosso organismo.

2. CONTRAÇÃO MUSCULAR

Quando contraímos a musculatura, gastamos algum substrato, sendo 70-76% da energia produzida perdida na forma de calor. Este é comunicado rapidamente para fora da célula, aquecendo o interstício (espaço entre as células), que, por sua vez, aquece o sistema vascular, que transportará um sangue mais quente.

O nosso sistema circulatório tem válvulas que permitem que a circulação fique mais ou menos próxima da pele, através de uma vasodilatação e de uma vasoconstrição, respectivamente. No caso da primeira, a abertura das válvulas permite uma comunicação muito maior com o tecido periférico, ou seja, a pele, facilitando as trocas de calor com o ambiente.

Ela é altamente hidratada, de modo que, quando recebe calor do sistema vascular, libera água pela glândula sudorípara, podendo trocar calor.

Sendo assim, para amarrar melhor a história, no capítulo 1 vimos, através de conceitos, formas de perder calor. Trazendo isto para o corpo humano, de modo que se possa explorar o tema na prática, vemos uma troca de calor por condução, célula a célula e entre elas e vasos.

Esse calor vai sendo comunicado à periferia, até aquecer aquela água eliminada pela glândula, que chamamos de suor. Posto isto, por conta do fenômeno da convecção, partículas do ar vão se chocando com nossa pele, retirando, para si, parte deste calor, de modo que nossa temperatura corporal possa ficar mais “estável”.

O leitor mais atento deve ter percebido que há um fator determinante para que este cenário todo se dê, e o nome dele é água! Se ela não estiver presente de forma satisfatória, não conseguiremos trocar calor adequadamente, de modo que nossa temperatura corporal comece a aumentar e diversos processos fisiológicos sejam prejudicados, levando, inclusive, à morte.


3. FALANDO EM NÚMEROS

Temos cerca de 60-70% do nosso peso corporal correspondendo à água (o número varia bastante de autor para autor). Por volta de 1/3 dela está no espaço extracelular e 2/3, intracelular, ou seja, você tem muito mais líquidos dentro de suas células do que em seu sangue, por exemplo.

A título de curiosidade, 76% do nosso músculo é água (ele conserva muito líquido em si mesmo pois estoca glicogênio dentro de suas células e, como alguns devem saber, cada 1g desse carboidrato guarda consigo cerca de 2,7g de água).

O osso, por sua vez, é composto por 22% de água; o tecido adiposo, 10%; a pele, 72%; o sangue 83%; as vísceras, 76% (Nose et al., 1994).


Quando perdemos 2% do nosso peso corporal em volume de água, já temos redução de performance esportiva, ou seja, nosso rendimento já cai (Costill et al., 1976). Para piorar, os mecanismos que ligam a reposição, que seria o “sentir sede”, só começam a se manifestar com 3% de perda!

Pois é, amigo leitor, quando você sente sede, já está um bocado desidratado e com o desempenho diminuído, portanto, fique ligado, caso contrário, estará afetando negativamente suas adaptações fisiológicas e metabólicas diante do exercício.

Além disso, o aspecto cognitivo também é reduzido, ou seja, a proporção de acertos e precisão caem e o tempo de resposta aumenta. Pensando num exemplo de jogo de basquete, o sujeito erraria mais passes, cestas, dribles e perderia a bola mais facilmente.

Com o aumento da desidratação ao redor de 7%, perdemos a maior parte do líquido plasmático, prejudicando bastante o volume sistólico, ou seja, aquele que o seu coração consegue ejetar.

E não subestime esses números, achando serem difíceis de alcançar, haja vista que um ambiente quente e úmido, cenário muito comum em boa parte de verão brasileiro, pode facilmente impor perdas hídricas na casa dos 6-8% (Cleary et al., 2006)...

Para fazermos os reajustes impostos pela desidratação, acabamos aumentando a frequência cardíaca, já que queremos impedir quedas ainda maiores da pressão arterial e do débito cardíaco. Quando este mecanismo não é suficiente, ocorre a liberação progressiva de hormônios antidiuréticos, como a vasopressina e a angiotensina, ocasionando vasoconstrição periférica, de modo a concentrar os líquidos na parte interna do corpo, aumentando a resistência periférica e mantendo a pressão arterial estável.


Obviamente, esta saída irá atrapalhar as trocas de calor, já que suaremos muito menos, e a temperatura corporal irá esquentar, o que é um bocado perigoso.

Para finalizar, podemos perder até 11% do nosso peso corporal em volume de água. Este valor seria o limite, sendo que, mais do que isso, o sujeito poderá vir a óbito. A título de exemplificação, um indivíduo de 100kg tem cerca de 70kg de água em seu corpo. Se ele perder 2kg desse líquido, já não conseguirá dar o seu melhor no treino, porém, só irá sentir sede e perceber que está desidratado quando já tiver perdido 3kg...

Quando o cara tiver 7kg de água subtraídos de seu corpo, começará a mostrar diversas respostas cardiovasculares, na tentativa de preservar algumas funções vitais, porém, se a desidratação chegar a 11kg, ele irá morrer.


Ficamos por aqui. No próximo artigo, veremos os estados de hidratação, o glicerol, os efeitos da hipoidratação e a necessidade de reidratação. Até lá!



FERNANDO PAIOTTI
Personal Trainer e Consultor Online
CREF 151531-G/SP


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