CINTO DE MUSCULAÇÃO PROTEGE A LOMBAR?


Fala galera!  No presente artigo, iremos discutir algo bastante polêmico e presente nas academias, utilizado, muitas vezes de forma incompreendida, como um acessório de proteção. Pois é, caro leitor, para quem não se atentou ao título, a ideia de hoje será a de responder a seguinte pergunta: cinto de musculação protege a lombar? Boa leitura e não se esqueçam de curtir e de compartilhar para ajudar na divulgação do meu trabalho!


CINTO DE MUSCULAÇÃO PROTEGE A LOMBAR? A ANATOMIA DO CORE
Treinar o core para fortalecê-lo foi algo que se popularizou de uns anos para cá, sendo a prancha uma das ferramentas mais utilizadas para tanto. Mas afinal, você sabe o que é o core?

Ele é um conjunto que, didaticamente, pode ser dividido em duas partes, sendo uma representada por músculos mais profundos, enquanto outra, por superficiais.

Em relação a estes últimos, temos como seus representantes os músculos do quadril, eretores de espinha, reto abdominal e oblíquo externo (EKSTRONET et al, 2007). Por conta da característica destes músculos de não se inserirem diretamente na coluna, e sim se ligando à pelve ou às costelas torácicas ou aos membros inferiores, este grupo de estruturas também recebe o nome de estabilizadores globais do core, permitindo uma estabilização secundária do tronco, haja vista que o papel principal fica com os músculos profundos da região (HUANG et al., 2009; KUMAR, 2011).

E por falar neles, os principais a serem mencionados são o transverso do abdômen, os oblíquos internos e os quadrados e multífidos lombares. Conforme mencionado acima, eles promovem uma estabilização primária do tronco, localizada, especialmente por conta da ação dos multífidos, que se conectam com cada um dos segmentos vertebrais lombares, viabilizando um mecanismo de co-contração em ação conjunta ao transverso do abdômen, proporcionando elevada estabilização segmentar (HUANG et al., 2014; WONG et al., 2013).

CINTO DE MUSCULAÇÃO PROTEGE A LOMBAR? O QUE A CIÊNCIA TEM MOSTRADO?
Muitas pessoas têm dúvidas acerca do uso do cinto de musculação, para que ele serve, como prender, como ele funciona, se diminui lesão, se é seguro, se interfere na atividade muscular, se dá mais força, se deixa mais estiloso na academia, e por aí vai.

Fiz uma varredura na qual julgo ser a melhor plataforma de buscas de artigos científicos, o Pubmed, e reuni 8 deles para fazermos nossa revisão sobre o tema, tendo como objetivo o de responder todas estas perguntas ao final desta publicação. Passemos, agora, a discutir brevemente cada um deles.

LANDER et al., 1990, avaliariam a efetividade do cinto de musculação durante o agachamento, comparando situações com e sem cinto, em intensidades de 70, 80 e 90% de 1RM (repetição máxima), utilizando, para tanto, 6 voluntários. Dentre os resultados, temos: os valores máximos de pressão intra-abdominal (que iremos chamar de PIA a partir de agora) foram sempre verificados nas condições com cinto, por outro lado, a atividade muscular do core foi maior nas condições sem o acessório.

McGill et al., 1990, avaliaram se o uso do cinto reduzia a atividade dos músculos do tronco e se aumentava a PIA. 6 indivíduos foram avaliados durante as condições de trabalho e foi verificado que a PIA aumentou de 90 para 120mmHg com o uso do cinto, além disso, a percepção subjetiva de sobrecarga no grupo foi menor nesta última condição.

Cholewicki et al., 1999, observaram que o uso do cinto interferiu na ação dos eretores de espinha: porção torácica na  extensão e lombar na flexão. A PIA foi aumentada.

KINGMA et al., 2006, avaliaram como o cinto afeta a compressão na coluna durante o levantamento de peso. Foi observado que o uso do cinto reduziu em 10% as forças de compressão, porém, apenas em situações onde o sujeito prendia a respiração durante a execução da repetição.

MIYAMOTO et al., 1999, avaliaram a influência do uso do cinto na perfomance, atividade muscular, PIA e trabalho de eretores de espinha. Como conclusão do trabalho, os pesquisadores apontaram maior PIA e capacidade de estabilização do tronco com o uso do cinto.

LANDER et al., 1992, avaliaram cinco sujeitos realizando múltiplas séries de agachamento, tendo investigado atividade muscular e PIA. Como resultado, tivemos maior velocidade nas repetições, maior trabalho muscular de vasto lateral e de posteriores de coxa e maior PIA na condição com cinto.

RAFACZ et al., 1996, investigaram o efeito do uso de cinto de musculação na pressão arterial (sistólica e diastólica) e frequência cardíaca. Após avaliar os 20 voluntários da pesquisa realizando as tarefas de exercícios, foi concluído que o uso do cinto não aumentou a frequência cardíaca, nem a pressão arterial sistólica, contudo, houve significativo incremento da pressão arterial diastólica. Tal fato chama atenção pelo aumento da carga cardíaca gerada, uma vez que pode ser preocupante, por exemplo, para hipertensos, por conta dos riscos aumentados de AVC e enfarto.

Por fim, WARREN et al., 2001, avaliaram o impacto do uso do cinto de musculação nos músculos abdominais oblíquos. 20 indivíduos foram avaliados treinando e foi observada uma queda no trabalho destes músculos com o uso do cinto.


CINTO DE MUSCULAÇÃO PROTEGE A LOMBAR? O CINTO, A ATIVIDADE MUSCULAR E O CORE
Agora que já vimos diversos artigos sobre o tema, vamos discutir o que pudemos apreender deles.

Em primeiro lugar, parece fato aceito que o uso do cinto de musculação faz a pressão intra-abdominal aumentar. Talvez você esteja se perguntando sobre a importância disso para a coluna, e o motivo é o seguinte: hipotetiza-se que a PIA aumentada gera uma maior estabilidade na porção lombar da coluna. Há quem argumente também que tal acessório, aumentando a pressão na cavidade abdominal, ajuda a descomprimir as vértebras, diminuindo a compressão entre elas em cerca de 10 a 30% (valores ainda não precisos e que variam de trabalho para trabalho).

Contudo, nem só com o cinturão isto pode ser feito: uma manobra de valsalva, que é aquela apneia que muitos levantadores de peso fazem, inspirando fundo e contraindo com força o abdômen sob pressão, também é capaz de aumentar a PIA.

Bom, já que o cinto é tão top assim, devemos utilizá-lo obrigatoriamente? Em todos os treinos pelo resto de nossas vidas?

A resposta é não e o motivo foi mostrado algumas vezes nesses trabalhos: por conta da maior PIA e capacidade de estabilização lombar, aparentemente há menor trabalho muscular do core, haja vista que ele é menos demandado para exercer estabilidade do tronco.

Apesar de algumas contradições entre os trabalhos, parece fato que ao menos os eretores de espinha são menos recrutados, fato que não necessariamente é ruim em casos isolados, contudo, poderá vir a ser com uso crônico do cinto, que irá impedir o desenvolvimento e fortalecimento de mecanismos próprios de estabilização.

Além disso, ainda temos a criação de uma possível dependência psicológica no uso do cinto de musculação para proteger a lombar, tirando a confiança do usuário quando este não é utilizado, e também o problema com a pressão arterial diastólica incrementada, fato que cronicamente gerará maior estresse cardíaco, podendo exacerbar uma hipertrofia concêntrica, sobretudo pelo tipo de atividade anaeróbia desenvolvida e pelo uso de esteroides anabolizantes, fatos comuns no esporte.

Sendo assim, para concluirmos, o uso do cinto é válido, porém, nem sempre. Caso você não seja um powerlifter/basista, utilize-o esporadicamente, por exemplo, dentro de uma periodização com um microciclo de treino com trabalhos de força bruta, poucas, reps, etc., e invista sempre num programa de fortalecimento para o core.

Com isto, encerramos e espero que tenham gostado da forma como apresentei o tema. Até o próximo artigo da série!

BIBLIOGRAFIA
- Lander JESimonton RLGiacobbe JK. The effectiveness of weight-belts during the squat exercise. Med Sci Sports Exerc. 1990 Feb;22(1):117-26.
- McGill SMNorman RWSharratt MT. The effect of an abdominal belt on trunk muscle activity and intra-abdominal pressure during squat lifts. Ergonomics. 1990 Feb;33(2):147-60.
- Cholewicki JJuluru KRadebold APanjabi MMMcGill SM. Lumbar spine stability can be augmented with an abdominal belt and/or increased intra-abdominal pressure. Eur Spine J. 1999;8(5):388-95.
- Kingma IFaber GSSuwarganda EKBruijnen TBPeters RJvan Dieën JH. Effect of a stiff lifting belt on spine compression during lifting. Spine (Phila Pa 1976). 2006 Oct 15;31(22):E833-9.
- Miyamoto KIinuma NMaeda MWada EShimizu K. Effects of abdominal belts on intra-abdominal pressure, intra-muscular pressure in the erector spinae muscles and myoelectrical activities of trunk muscles. Clin Biomech (Bristol, Avon). 1999 Feb;14(2):79-87.
- Lander JEHundley JRSimonton RL. The effectiveness of weight-belts during multiple repetitions of the squat exercise. Med Sci Sports Exerc. 1992 May;24(5):603-9.
- Rafacz WMcGill SM.Wearing an abdominal belt increases diastolic blood pressure. J Occup Environ Med. 1996 Sep;38(9):925-7.
- Warren LPAppling SOladehin AGriffin J. Effect of soft lumbar support belt on abdominal oblique muscle activity in nonimpaired adults during squat lifting. J Orthop Sports Phys Ther. 2001 Jun;31(6):316-23.




FERNANDO PAIOTTI
Personal Trainer e Consultor Online
CREF 151531-G/SP


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