O ano era 2007 e estávamos em pleno verão.
Você sabe o que isto significa? Academia lotada, “cheia”
de mulheres, turistas a passeio e os famosos frangos de verão. Eu já tentei
fazer uma estimativa, meio que por cima, de quantos destes novatos acabavam
vingando no ginásio onde eu treinava, mas confesso que foi muito difícil. Com
uma aproximação grosseira, diria que não passavam de 5-10% a cada temporada.
Para nós marombeiros, tal fato é muito fácil de entender:
são poucos os que sobrevivem à seleção artificial do ferro. Os menos adaptados
são facilmente rechaçados e viram apenas estatísticas, além de uma irônica ficha
de treino perdida em algum canto da academia.
A primeira rasteira que o iniciante toma está no fato de
que a musculação não é um esporte fácil (se bem que não a vejo como um esporte,
mas um estilo de vida...). Nas atividades mais singelas, que não vou citar
nenhum exemplo para ninguém ficar chorandinho aí depois, o cara faz o treino
dele com os amiguinhos, diverte-se, vai embora e volta a ser uma pessoa normal.
No contexto do fisiculturismo, esqueça isso!
Entendam que o treino com pesos, de 45 a 60 minutos,
corresponde a apenas 4% do treino total, de 24 horas por dia, que um marombeiro
faz. Nos outros 96%, o indivíduo vai continuar a brincadeira, desta vez se
exercitando com garfo e faca (por diversas vezes) e, por último, na cama (não,
não estou falando de uma boa transada, mas sim de uma boa noite de sono... Se
bem que... Bom, nada impede que você faça os dois também né?! Corrigindo,
então, dê uma boa transada e depois durma!).
Sendo assim, no momento em que o “aspira” saiu da
academia e voltou a ser um ser humano normal, ele já se fodeu, porque a
musculação é muito vingativa e vai cobrar o seu preço.
Esse turista de verão, totalmente frustrado com o
“físico” que obteve para pular o carnaval, vai virar o famoso vacilão/coitado
que adora espalhar “só cresce quem toma bomba” e vai largar o esporte,
tentando, através da difamação, esconder a vergonhosa derrota e a total
impotência perante os halteres: criou-se o primeiro órfão do ferro, abandonado
pela própria musculação, que não aceita fanfarrões.
Fico aqui, vazia, no aguardo daqueles dispostos... |
Os que sobreviveram ou por algum motivo escolheram
insistir no erro, vão passar pelo segundo crivo, que contarei através de uma
pequena história:
Você ganhou uma viagem de 15 dias com tudo pago para a
França. Uhul! Aquela comemoração toda! Vai conhecer a Champs-Élysées, a Tour
Eiffel, o Château de Versailles, o Louvre... Ao final da quinzena, você vai
voltar para este paisinho de merda no qual nos encontramos. Sendo assim,
podemos tirar algumas conclusões:
- Você ESTAVA
na França e desfrutou da cultura dos franceses por alguns dias;
- Você NÃO
VIROU um francês: continuou sendo um brasileiro. Aos olhos de um
habitante desatento do local, TALVEZ
você tenha se passado por um francês, mas é fato que JAMAIS o foi.
- A viagem não foi eterna, uma vez que tinha prazo para
acabar, e, ao final deste, você voltou a sua vida de sempre. E todos
viveram feli... Ops!
Posto isto, agora eu pergunto: o cara que começa a
frequentar um ginásio de musculação se torna, necessariamente, um marombeiro/fisiculturista?
O indivíduo está sendo um
frequentador do ginásio, ou é
um frequentador do ginásio? São coisas totalmente diferentes...
Se ele está sendo um frequentador, ele fatalmente
cairá na história do turista da França e jamais se tornará um “francês”; caso
ele seja um frequentador, podemos dizer que aí sim teremos um “francês”.
É simples assim: quem vai para a academia para se divertir, relaxar,
socializar, participar da moda, enfim, fazer o papel de “turista”, JAMAIS será
um marombeiro... Estará apenas conhecendo uma cultura diferente e vendo alguns
“habitantes nativos em suas massacrantes rotinas cotidianas”. Resumindo: estará
fazendo um passeio, e como todo passeio, cedo ou tarde ele acaba...
Nossa, que trágico! A musculação fez mais um órfão do
ferro: o turista que vai à academia por lazer e sonha em ter um corpo
sensacional com treinos recreativos e inconstantes.
O terceiro crivo, que é o melhor amigo de todo marombeiro
sério, chega para terminar o estrago: o inverno! Não sei se todos compartilham
deste meu gosto, mas era, antes de eu ter meu próprio ginásio, a minha época favorita
de treino, simplesmente pelo fato de o estabelecimento ficar mais deserto.
Não era incomum treinar ao lado de apenas 5 pessoas, que
nessa altura podemos até arriscar chamar de marombeiros, sem ouvir pedidos de
atenção ou de “divisão” de aparelho. Para completar, o treino ainda rendia
muito mais sem aquele calor abafado que nos dá um cansaço característico.
O inverno, implacável como sempre, esmagou quem queria “#esmagar”,
espantou quem queria “#fika grande”, fazendo mais alguns incontáveis órfãos do
ferro!
Quem sobreviveu até aqui, passará pelo quarto crivo e
conhecerá, provavelmente, a pior faceta do esporte: a falta de instrução.
Alguém já nasce sabendo como treinar pesado? Como comer
adequadamente? Ganhar força? Hipertrofia? Fazer um bom cutting? Não. Sendo
assim, de algum lugar você terá de aprender. O primeiro contato, normalmente, é
com quem faz o papel de “instrutor” de musculação.
Infelizmente, a chance de você cair na mão de um profissional
meia-boca, fraquinho, com uma visão deturpada do esporte, é altíssima. Eu sei
que é foda, mas foi o meu caso no meu início (orra! E como foi!), foi o caso de
100% das pessoas que já vieram procurar minha orientação e provavelmente é o caso
de quem está lendo este texto.
Sinceramente, a coisa só tende a piorar, uma vez que,
como a musculação tem passado por um processo que gosto de chamar de banalização
(“modinha”) e de industrialização (para que se torne um bem de consumo
como outro qualquer), a demanda por profissionais da área tem aumentado,
fazendo, inevitavelmente, com que percamos, ainda mais, qualidade nos
serviços...
... dispostos a me superarem. Não por moda, não por esporte, mas por amor. |
Mas
e aí? Como vou me virar então, Fernandão? Lendo teu site?
Não! Quem achou que falei estas coisas para me promover,
está bastante enganado. Grande merda o meu site, eu não sou o dono da verdade,
oras... Lendo meus textos, eu dou apenas alguns subsídios para você refletir e
pesquisar em outros locais, debater com amigos, estudar, não ser enganado por
picaretas, etc. Aqui, você conhecerá o meu ponto de vista em relação aos temas
do esporte, não conhecerá, em muitos casos, verdades absolutas...
(Quem quiser entender melhor sobre o meu projeto
“ensinando musculação”, clique aqui.)
Continuando, o que fazer então? Bom, recomendo que você
estude e muito, especialmente através de livros didáticos e sites de confiança.
Nunca tenha por base um único autor, caso contrário, você terá a mesma visão de
mundo que ele. Tenha sempre VÁRIAS fontes. Os fóruns de musculação também são
bons, porém, é bastante difícil separar o joio do trigo ali, portanto, tome bastante
cuidado.
Tendo em vista este contexto final, temos a desinformação
e o abandono dos alunos dentro das academias terminando de criar a legião de
tristes órfãos do ferro. Se mesmo assim você insistir em batalhar, parabéns,
meu amigo marombeiro!
Agora, é só esperar que o último crivo da musculação
aconteça: que a vida faça o seu último órfão do ferro...
FERNANDO PAIOTTI
Personal Trainer e Consultor Online
CREF 151531-G/SP
Para conhecer meus serviços de consultoria online, currículo, fotos de alguns alunos e muito mais, clique AQUI ou envie email para: fernando.paiotti@gmail.com
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