Fala rapaziada!
No último artigo falamos um
bocado sobre os tipos de articulações e comecei a discutir ligamentos.
Continuemos, então, de onde paramos.
2. LIGAMENTOS
CONTINUAÇÃO...
A zona elástica é composta pelas
fases de carregamento (fibras frouxas) e fisiológica, que se traduzem em
momentos totalmente normais de nossa vida cotidiana, que não causam nenhum dano
e que permitem que o tecido volte ao normal após o recrutamento.
Porém, ainda na zona elástica, e
como transição à plástica, temos o ponto de microfalha, que seria um período
onde você começa a causar dano, perdendo parte das fibras de colágeno.
Caso pare neste momento, conseguirá
manter quase que total integridade do tecido, já que ele voltará ao normal, porém, com algum dano (característica plástica), podendo recuperá-lo totalmente, sem
sequelas, em algo como 10 dias.
Sendo assim, este ponto seria uma
espécie de aviso, só que um tanto quanto perigoso: no caso do osso, ele não
possui essa característica, então simplesmente fratura e você é obrigado a
interromper a atividade na hora; já no ligamento, você vai sentir dor e desconforto, contudo, ainda terá estabilidade
suficiente para que continue a atividade... Nessa hora ouvimos todo tipo de
merda e imbecilidades, como: FORÇA! GARRA! SUPERAÇÃO! NO PAIN, NO GAIN!
MONSTRO! FIKAGRANDEPORRA!
Pois bem, acontece que o atleta e
o treinador experientes sabem que quando o ponto de microfalha é atingido a
brincadeira deve ser interrompida na hora e isso não tem nada a ver com ter
muita garra ou ser um frouxo com frescurinha, má vontade, vendido, etc.
Ao ultrapassar esta zona, você
deixará seu ligamento esgarçado e pronto para arrebentar, aí meu amigo, você
precisará de nada mais, nada menos, que um ano e meio para voltar totalmente ao
normal após a cirurgia!
Digo isto por experiência própria
pois eu mesmo já fiz uma operação destas, no meu punho direito, tendo voltado a
usar cargas realmente pesadas quase dois anos depois da cirurgia, porém, nunca
mais voltei ao que era antes. O procedimento não aconteceu por
burrice na musculação, mas sim por um acidente com um trabalho manual de
jardinagem, acreditem se quiserem... Foi um preço realmente alto a se pagar.
Após algumas semanas da cirurgia
observa-se que apenas 50% da resistência ligamentar está presente. Ao final de
um ano, 91% do total é adquirido, ou seja, demora muito mais do que 12 meses para
você voltar a 100%. Sendo assim, se não respeitar com carinho esse descanso,
uma nova operação o espera (Noyes, 1977).
Coisas como gravidade da lesão,
suprimento sanguíneo na região, fatores endócrinos (relacionados ao sexo),
genética, tipo de intervenção do médico e do fisioterapeuta, genética, etc,
irão influenciar no período de recuperação, porém, não há mágica no processo e
ele tende a ser muito lento.
Para encerrar, o que quero que o
leitor entenda é que aquela repetição a mais, com uma carga incompatível, que
normalmente acompanha má técnica, pode ser algo bastante perigoso, haja vista
que por conta de alguns segundos você irá estragar todo um trabalho duradouro,
que às vezes pode ser de anos, dado que ficará um bom tempo de molho.
O mesmo vale para esportes como
futebol, em que o cara dá aquela famosa “torcida no tornozelo” e tenta jogar
mais alguns minutos na partida. Todo mundo aplaude o cara como raçudo, fodão,
amor à camisa, porém, ele terá grandes chances de ficar um ano afastado e
esquecido...
Ah, e só pra encerrar: se você é
usuário de esteroides anabolizantes, cuidado redobrado, pois ao mesmo tempo em
que aumentam a síntese proteica e os ganhos em força, incrementam a degeneração
de colágeno, de tal sorte que o músculo fique mais forte, enquanto o tendão,
por sua vez, pode se mostrar mais fraco/ não acompanhar o desenvolvimento, deixando-o suscetível a estiramentos de graus variados.
3. EXERCÍCIO FÍSICO
E TENDÕES/LIGAMENTOS
Uma pergunta que pode surgir na
cabeça do leitor é a seguinte: “Ok, vi que o ligamento/tendão tem sua
fragilidade e se a ultrapassarmos corremos o risco de sofrer graves lesões.
Sendo assim, é possível fortalecê-lo?”.
A prática de atividade física é
capaz de aumentar sim a resistência desses tecidos, através de adaptações
crônicas. O treinamento de força (por
exemplo, a musculação) capacita o praticante, com o tempo, a aumentar a carga
de exercícios, haja vista que vai ocorrendo uma supercompensação no que tange à
resistência dos tendões e ligamentos, ou seja, eles vão ficando mais fortes e
menos vulneráveis à tração mecânica.
O treino também aumenta a
estabilidade articular de forma ativa, com participação do SNC (sistema nervoso
central), incrementando a capacidade estabilizadora do músculo, ao contrário da
passiva, que vimos no parágrafo anterior.
Tais adaptações são muito
bem-vindas não só para nós marombeiros, mas também para idosos, dado que o
envelhecimento aumenta a perda de resistência nos ligamentos, além de trazer
instabilidade articular, aumentando sensivelmente a suscetibilidade às lesões
da cartilagem articular (Buckwalther & Lane, 1997)
Outro ponto interessante que vale
a pena ser discutido é o uso do alongamento balístico, também chamado de
dinâmico, que é aquele com movimentos explosivos tentando atingir o máximo da
amplitude articular, ao contrário do estático, onde você vai vagarosamente até
a amplitude máxima e se mantém na posição por longos e torturantes 15-30
segundos (caso queira maiores informações sobre alongamento, clique AQUI e leia uma série que
escrevi).
Uma informação que ainda não
citei é que os ligamentos e tendões, assim como os ossos e músculos, são
tecidos viscoelásticos, logo, são taxa dependentes. Isto quer dizer que eles
respondem melhor com altas cargas aplicadas rapidamente, com velocidade,
aumentando o stiffness (“resiliência, resistência”) com o crescimento da taxa
de aplicação de força. A título de exemplificação, digo-lhe que temos um aumento
de 50% da “resistência” do ligamento quando quadruplicamos a carga!
Porém, perceba que no caso do
alongamento balístico, tomamos medidas que servem justamente para aumentar esse
stiffness, sendo assim, para conseguirmos grandes amplitudes, temos que aplicar
cargas muito grandes (isso sem mencionar os reflexos musculares que também
reduzem a amplitude).
Tal procedimento acabará por
aumentar a suscetibilidade a lesões articulares, sendo assim, não recomendo
para qualquer tipo de pessoa.
Se você não é um atleta que
compete em modalidades, restringido-se apenas à prática de exercícios por
hobby, lazer, interesses pessoais, use o alongamento estático que já está de
bom tamanho, haja vista que o balístico tem um caráter mais específico a atletas, pois simula movimentos dos esportes nos quais eles competem.
Bom, mas por que lancei essa
pergunta de ser possível ou não melhorar a resistência do ligamento com a
atividade física?
Porque muitas pessoas
acreditavam, e algumas devem afirmar até hoje, que este tipo de tecido não se
adapta ao treinamento, uma vez que tem uma taxa metabólica baixíssima. De fato o metabolismo é péssimo,
tanto é que nem adianta tomar anti-inflamatório para lesões nele, pois o
medicamento nem consegue chegar no local...
Porém, foi observado em pesquisas
que, quando retiramos qualquer estímulo de um ligamento, como no caso de uma
imobilização, por exemplo, a resistência dele começa a cair (é reduzida em 70%
depois de 9 semanas, Woo et al., 1982).
Sendo assim, podemos afirmar que
ele é capaz de responder a estímulos mecânicos, e o resultado observamos, por
exemplo, com análises clínicas feito ressonância magnética, mostrando aumento
da área de secção transversa do ligamento (hipertrofia), aumento da quantidade
de colágeno nele e incremento da resistência mecânica à tração.
Por conta do metabolismo baixo,
essas adaptações levam meses para que ocorram, porém, basta se dedicar que
acontecerão.
Para finalizar, é importante que
se mencione que não basta aplicar qualquer estímulo para ter uma resposta boa,
mas sim um estímulo que seja adequado. Com isto, quero dizer que a carga deve
ser suficientemente acima daquela que seu corpo está perfeitamente adaptado a receber, de modo que ele tenha de compensar a diferença melhorando a si
mesmo. Por outro lado, a carga não pode
ser alta demais, caso contrário, você atingirá o ponto de microfalha, ou acima
dele, e irá se lesionar (Magnusson et al., 2003).
O grande Xis da questão é que
dosar carga de treino não é uma tarefa fácil, afinal, quantas pessoas você não
conhece que têm algum tipo de lesão, seja grave, seja leve?
O leigo interpreta a lesão como
uma consequência normal da atividade física, porém, o profissional sério da
educação física sabe que estas decorrem tanto por despreparo do atleta, quanto
por despreparo do instrutor/treinador, coisa assustadora e
absurdamente comum em nossa área, englobando a maioria dos profissionais...
Ficamos por aqui. Continuamos na próxima parte desta série. Até lá!
FERNANDO PAIOTTI
Personal Trainer e Consultor Online
CREF 151531-G/SP
Para conhecer meus serviços de consultoria online, currículo, fotos de alguns alunos e muito mais, clique AQUI ou envie email para: fernando.paiotti@gmail.com
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