É VERDADE QUE NÃO DEVEMOS DEIXAR OS JOELHOS PASSAREM AS PONTAS DOS PÉS NO AGACHAMENTO?


Fala galera!  Feliz 2019!! No primeiro artigo do ano, iremos discutir uma das lendas mais famosas quando o assunto é este famigerado exercício de pernas: é verdade que não devemos deixar os joelhos passarem as pontas dos pés no agachamento? Boa leitura e não se esqueçam de curtir e de compartilhar para ajudar na divulgação do meu trabalho!


JOELHO E PONTA DOS PÉS - A LENDA!
Como disse na introdução, creio que todo mundo já ouviu, ou ouvirá um dia, a famosa lenda acerca de que não devemos deixar os joelhos passarem a ponta dos pés no agachamento, uma vez que isto, em tese, aumenta muito a “sobrecarga” articular, sendo “perigoso” porque “lesiona”...
Apesar de ninguém conseguir explicar o porquê, usando sempre termos genéricos, que coloquei entre “aspas”, todos acabam temendo e seguindo essas dicas. Mas será que isto é verdade mesmo????


JOELHO E PONTA DOS PÉS – A ORIGEM
Não sei se foi daqui que a lenda surgiu, porém, vou aproveitar a deixa para explicar algo importante: quando realizamos exercícios de pernas, com flexão de quadril e de joelhos, como é o caso do agachamento, terra sumô, leg press, etc., temos de deixar joelhos (patelas), tornozelos e pés alinhados. Na verdade, são estes dois últimos que deverão mudar seu posicionamento, normalmente, virando-se para fora, a fim de acompanhar a trajetória do primeiro, haja vista que o contrário não faz sentido.

Dentre os motivos, ocorre que nossa patela (osso redondo do joelho) tem uma espécie de trilho para deslizar, sendo assim, por conta de compressão e de lateralização, devemos deixá-la em harmonia com tornozelo e pés, a fim de evitar sobrecarga desnecessária que, dentre as possibilidades, poderão causar desgaste articular de cartilagem patelofemoral, o que é péssimo, uma vez que é irreversível e que pode causar considerável incapacidade cronicamente.


JOELHO E PONTA DOS PÉS – A VERDADE
Bom, mas sobre a pergunta se é verdade que não devemos deixar os joelhos passarem as pontas dos pés no agachamento, vejamos o que um estudo biomecânico tem a dizer.

FRY et al., 2003, compararam dois tipos de agachamento, um livre/tradicional, sem interferência alguma (A), e um com uma restrição (uma placa de madeira) nos joelhos que os impedia de ultrapassarem as pontas dos pés (B), vide figura abaixo.

Sete homens, na faixa de 27 anos, experientes em treino de musculação, foram filmados executando as duas variações do exercício, tendo o torque no quadril e nos joelhos sido calculado em ambas as ocasiões, conforme tabela abaixo.

TORQUE NO JOELHO
TORQUE NO QUADRIL
JOELHO SEM RESTRIÇÃO
150,1 +/- 50,8
28,2 +/- 65
JOELHO COM RESTRIÇÃO
117,3 +/- 34,2
302,7 +/- 71,2
Foi observado que, na versão livre, sem restrições, o torque no joelho foi 150,1 +/- 50,8, enquanto que, no quadril, 28,2 +/- 65; na versão com o impedimento nos joelhos, tivemos 117,3 +/- 34,2 para os joelhos e 302,7 +/- 71,2.

Num primeiro momento, quando o leitor bate o olho nos resultados para o joelho, parece que de fato eles foram mais altos na versão onde essa articulação não tinha nenhuma restrição, parecendo que a galera que defende que os joelhos não devem passar as pontas dos pés estava certa!

Ledo engano, caro leitor: os números que vêm após o sinal de +/- são o desvio padrão, sendo assim, o torque no joelho sem restrição foi entre 99,3 e 209,9, enquanto na versão com, 83,1 e 151,5, ou seja, seus resultados estão dentro do mesmo intervalo e pode ser que a sobrecarga entre ambos seja a mesma. Mas tudo bem, vamos admitir que, na verdade, o torque no joelho livre é necessariamente maior do que naquele que tinha o impedimento pela placa de madeira, contudo, o que se mostrou inadmissível com esta “precaução” que as pessoas defendem foi o gigantesco torque gerado no quadril: 28,2 +/- 65 Vs. 302,7 +/- 71,2!!! Foi um incremento colossal!!!

O que ocorreu foi que a sobrecarga que era do joelho foi inapropriadamente transferida para o quadril e para a região lombar da coluna, e transferida de uma maneira muito ruim, diga-se de passagem, uma vez que a adaptação alterou o padrão de movimento, afetando totalmente a distribuição de forças entre joelhos e quadris, assim como a cinemática do exercício. Para completar, também foi vista maior inclinação anterior do tronco, sobrecarregando mais a coluna, e maior ângulo interno nos joelhos e tornozelos.


JOELHO E PONTA DOS PÉS – A CONCLUSÃO
Com isto, finalizamos, e agora creio que os leitores puderam perceber que é bastante infeliz a recomendação de que não devemos deixar os joelhos passarem as pontas dos pés no agachamento, haja vista que isto reduz apenas um pouco a sobrecarga nesta articulação, porém, cobrando um preço exorbitante em libras esterlinas e com juros diários, uma vez que altera todo o padrão de movimento do exercício, impondo uma sobrecarga avassaladora na sua coluna lombar e em seu quadril, além de tirar a naturalidade do exercício. Sendo assim, siga apenas a dica que dei no segundo tópico deste artigo, sobre alinhamento de patela, tornozelo e pé e agache!

BIBLIOGRAFIA
- Fry ACSmith JCSchilling BK. Effect of knee position on hip and knee torques during the barbell squat. J Strength Cond Res. 2003 Nov;17(4):629-33.



FERNANDO PAIOTTI
Personal Trainer e Consultor Online
CREF 151531-G/SP


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